terça-feira, 5 de setembro de 2017

Cláusula de Desempenho e a Reforma Política

Tramita no Congresso Nacional um Projeto de Emenda à Constituição (PEC) onde se prevê que somente terão acesso ao fundo partidário e ao direito de antena (tempo de Televisão), os partidos que, a partir das eleições de 2018, obtenham um mínimo de um e meio porcento dos votos válidos apurados nacionalmente e um porcento em pelo menos nove Estados.

Caso promulgada, a PEC diminuirá consideravelmente a quantidade de partidos no país, que hoje tem um número excessivo. O alvo é acabar principalmente com os chamados "partidos nanicos". Com restrições ao fundo partidário e horário de rádio e TV, a tendência é as siglas menores deixarem de existir ou se fundirem a uma maior.

            Alguns argumentos colocados para que se implemente a cláusula de desempenho é que ela se perfaz em um mecanismo fundamental para a consolidação do quadro partidário brasileiro, hoje bastante disperso. A pulverização de partidos políticos no Congresso Nacional, sem que novas medidas de fortalecimento da identidade e fidelidade partidárias tenham sido eficazmente implementadas, cria dificuldades para o funcionamento do Poder Legislativo e contribui para um maior distanciamento entre a população e seus representantes. Ademais, o número excessivo de partidos representados no Parlamento, cria problema para a governabilidade, pois, dificulta o funcionamento do presidencialismo de coalizão.

            Porém, deve ser levado em conta o fato de que alguns partidos históricos e ideológicos como por exemplo o Partido Comunista do Brasil – PCdoB e o Partido Socialismo e Liberdade - PSOL, com programas definidos e com anos de atuação no cenário político brasileiro, deixariam de funcionar de forma plena como acontece hoje em dia ou, para continuarem tendo esse funcionamento, deverão se fundir com algum outro partido, que talvez não tenha a mesma linha de pensamento, fazendo assim uma união pontual.

            Ao mesmo tempo, as chamadas “legendas de aluguel” deixariam de existir, melhorando consideravelmente a relação partidária, o legislativo e a relação entre o executivo x legislativo no Brasil, que hoje se dá de forma tão promíscua. Não precisando o Poder Executivo ‘corromper’ tantos partidos para formar sua base de sustentação.

            O que não se pode no entanto, é achar que a diminuição do número de partidos resolverá a questão relativa a ideologia dos partidos políticos, pois, como vemos os maiores partidos são talvez, os que menos tenham postura programática e quem constrói essas ideologias são as pessoas que, apenas mudariam do partido que perdeu representatividade para um partido com representatividade, não tendo como motivo de troca a questão ideológica, fazendo assim com que os partidos continuem sem caráter ideológico e aí poderíamos ter o fenômeno de que ao invés de se “corromper” partido para se ter governabilidade, terá que “corromper” parlamentar diretamente, já que os partidos sobreviventes às cláusulas de desempenho estariam com um número muito maior de congressistas.

            Isso posto, fica claro que o fortalecimento dos partidos políticos e do nosso sistema político, passa por um debate mais amplo e não apenas pela diminuição do número de partidos, pois a cláusula de desempenho, apenas ajuda a acabar com o direito de uma minoria que é representada por partidos pequenos que tem ideologia.

            Cabe salientar também, que os partidos que compõem o Congresso Nacional, lá se encontram por decisão dos eleitores que nos últimos anos vêm demonstrando a sua vontade de ampliar o número de partidos que os irão representar, basta ver o aumento de legendas a cada pleito eleitoral. Como também, parte de uma ampla mobilização popular para a criação de novos partidos, pois sem assinaturas dos eleitores, não se pode criar partidos políticos.

            Portanto, não podemos deixar de levar em conta a vontade do eleitor, que nesse caso é e de fato tem que ser soberana, não cabendo ao legislador mudar essa vontade através de Leis que não representem a vontade popular, dificultando assim o funcionamento de partidos que queiram se iniciar na vida política do país.

            Pois, se de fato fosse verídico o entendimento de que o eleitor não está satisfeito com o número de partidos existente, esses não estariam representados no parlamento, pois se lá estão, receberam votos para isso, e uma forma de se medir se de fato esse voto representa este partido seria acabando com as coligações proporcionais e não criando a cláusula de desempenho.

            Assim, cada partido teria que defender suas bandeiras ideológicas para continuar tendo representatividade, não se valendo do voto dado ao partido X que elege candidato do partido Y, mostrando que de fato teve representatividade para continuar atuando plenamente no cenário político.

            O problema do sistema eleitoral brasileiro, que é ruim, não reside nesse aspecto do desempenho dos partidos. Não é aí que se mede a sobrevivência dos partidos, ela deve ser avaliada por sua história, pelo seu programa e o que estão querendo fazer é uma inversão completa do que deve ser um sistema eleitoral pujante e sólido

            A PEC abre possibilidade de um candidato de um partido com baixo desempenho tomar posse na Câmara, ainda que com restrição de direitos, o que em tese não diminuiria o alto número de partidos, e passar a partir daí a negociar para qual legenda irá ou com qual partido o seu se fundira, o que deixara o jogo dento do Congresso Nacional mais fisiológico ainda e não resolvera o problema da representatividade existente hoje em nosso sistema.

            Por fim, só uma ampla reforma, que englobe mudanças em toda a sua estrutura, trará efeitos práticos de fato, mudanças pontuais são apenas paliativas que não mechem de fato no cerni da questão e não resolverão o problema do sistema eleitoral brasileiro.

           
Gabriel Villarim

Advogado e Pós-Graduando em Direito Eleitoral